UNIÃO

“O Espiritismo tem princípios que, em razão de se fundarem nas leis da natureza, e não em abstrações metafísicas, tendem a tornar-se, e certamente tornar-se-ão um dia, os da universalidade dos homens. Todos aceitarão, porque serão verdades palpáveis e demonstradas, como aceitaram a teoria do movimento da terra; mas pretender que o Espiritismo em toda parte seja organizado da mesma maneira; que os Espíritas do mundo inteiro sejam sujeitos a um regime uniforme, a uma mesma maneira de proceder; que devam esperar a luz de um ponto fixo, para o qual deverão fixar o olhar, seria uma utopia tão absurda quanto pretender que todos os povos da terra um dia não formem senão uma nação, governada por um único chefe, regida pelo mesmo código de leis e sujeita aos mesmos usos. (…) Os espíritas do mundo inteiro terão princípios comuns, que os ligarão à grande família pelo laço sagrado da fraternidade, mas cuja aplicação poderá variar conforme as regiões, sem que, por isto, seja rompida a unidade fundamental, sem formar seitas dissidentes que se atirem a pedra e o anátema, o que seria antiespírita, de saída.”  Kardec, Revista Espírita de 1868. Edicel, São Paulo, pág. 391.

                Observamos assim, que a preservação da unidade do pensamento espírita exige tolerância, que é uma atitude de respeito aos pontos de vista dos outros e de compreensão para com suas eventuais fraquezas. Não deve ser falsa, como a do orgulhoso que se supõe infalível e adota um silêncio compassivo em face de todos os que não adotam o seu modo de pensar ou de agir. A verdadeira tolerância é humilde, mas convicta. Respeita as ideias e condutas dos demais, sem desprezá-las, mas também sem minimizar as diferenças, porque tem a certeza de que o apreço é indispensável para o diálogo e para criar um clima necessário a uma colaboração no nível elevado dos grandes objetivos comuns.

           União não é sinônimo de uniformização.

            A uniformização das atitudes humanas tolhe a liberdade não só de agir, mas inclusive de pensar, tornando-se assim, perniciosa em toda e qualquer época da humanidade. Mostra-nos o comportamento da sociedade que nem tudo o que se uniformizou necessariamente se uniu.

Deolindo Amorim, no livro Espiritismo em Movimento, psicografado pelo médium Elzio Ferreira, Salvador-BA, 1999, p. 101, nos traz profundas reflexões sobre o tema:

 
“A unidade deve ser estabelecida sobre princípios, e não sobre nuanças, detalhes, técnicas e processo. Isto seria estiolar o próprio Espiritismo que em si é dinâmico.” E, mais à frente, “busca-se a unidade onde ela não pode encontrar-se, porque os próprios Espíritos, mesmo aqueles que convivem numa mesma comunidade espiritual, utilizam de procedimentos diversos no desempenho de suas funções, do que naturalmente resultará em diferenças nas manifestações e em suas recomendações. O pensamento diferente não significa divergente, é bom que se diga. Portanto, podemos chegar a uma segunda conclusão – a unidade da Doutrina deve ser buscada na concordância dos princípios gerais.”

            Podemos afirmar que ninguém foi mais preocupado com a questão da união doutrinária do que Kardec. Mas, concomitantemente, ninguém foi mais pluralista do que o próprio Kardec. Estabeleceu os princípios fundamentais da doutrina espírita, magnificamente expostos naquilo que denominou de “credo espírita”, inserido no discurso pronunciado na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas – SPEE no dia 1º de novembro de 1868. A par disso, entretanto, propôs a adoção de um espírito de irrestrita liberdade de opinião e de pesquisa, dentro do amplo universo onde se situam os postulados básicos doutrinários. Recomendou, ademais, que os espíritas se organizassem institucionalmente de acordo com suas peculiaridades, não sob rígidos esquemas hierárquicos, mas preservando, sempre, entre eles, vínculos de trabalho, solidariedade e tolerância.

 Kardec em O Livro dos Médiuns (item 35) afirma: Os que desejem tudo conhecer de uma ciência devem necessariamente ler tudo o que se ache escrito sobre a matéria, ou, pelo menos, o que haja de principal, não se limitando a um único autor. Devem mesmo ler o pró e o contra, as críticas como as apologias, inteirar-se dos diferentes sistemas, a fim de poderem julgar por comparação. Por esse lado, não preconizamos, nem criticamos obra alguma, visto não querermos, de nenhum modo, influenciar a opinião que dela se possa formar. Trazendo nossa pedra ao edifício, colocamo-nos nas fileiras. Não nos cabe ser juiz e parte e não alimentamos a ridícula pretensão de ser o único distribuidor da luz. Toca ao leitor separar o bom do mau, o verdadeiro do falso.”

            Centros espíritas não podem ser instrumentos de dominação ou de exercício de poder. Sua finalidade não é a de exercer mecanismos de controle do pensamento ou da ação dos espíritas. Sua ação, no âmbito de uma corrente filosófica que privilegia a liberdade de pensar, deveria, precipuamente, transformá-los em forças aglutinadoras, estimuladoras do estudo, da pesquisa, do debate enriquecedor e do convívio fraterno entre todos os espíritas.

Nossa meta essencial é o amor, a atitude que reflete Deus em nós.

            Levantemos a bandeira da ética e da tolerância em torno da qual nos será possível atrair pela ação mais do que pelo discurso. Ensejemos a formação de polos de congraçamento ecumênico entre nós, os espíritas com diversidade de ideias, mas num único sentimento, o do amor exalando a fraternidade.

 

 

 

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